Marjane Satrapi
Contraponto (Portugal, 5 de Abril de
2012)
150 x 235 mm, 352 p., pb, brochado
Resumo
Chega hoje às livrarias
portuguesas “Persépolis”, considerado a primeira banda desenhada iraniana, que é
um longo romance gráfico autobiográfico dividido em duas partes.
A primeira, conta a
adolescência de Satrapi, neta de um imperador do país, educada no seio de uma
família de bom nível cultural e económico, no Irão, entre 1978 e 1984, um país conturbado
pela revolução que levou os fundamentalistas islâmicos ao poder e à restrição
de muitas das liberdades individuais.
Na segunda, encontramos a
autora a viver na Áustria, entre os 14 e os 18 anos, e o seu regresso posterior
ao Irão, sentindo-se, em ambos os casos, uma inadaptada e desajustada do local
onde vivia.
Desenvolvimento
Há quase uma década, a 8 de
Novembro de 2003, escrevi no jornal de Notícias a propósito de Persépolis:
“(…) Em
"Persépolis", Marjane Satrapi, a única autora iraniana de BD de um
país onde esta arte não existe, evoca com lucidez as suas memórias de infância,
para relatar, com alguma ingenuidade, ternura e mágoa, a revolução religiosa
que o Irão atravessou. E, principalmente, as suas consequências na vida de uma
menina de 10 anos, que nos vai transmitindo – com a simplicidade de uma menina
de 10 anos – experiências, medos, sensações e angústias.
Como ganhou consciência
social. Como Deus, Marx, religião, comunismo, política, família e História
convivem na sua cabeça. Como, em certa altura, era motivo de orgulho – para si,
para todos – ter na família ex-presos políticos, se possível torturados.
Uma menina que narra como foi
perdendo os amigos que fugiam de um regime islâmico em
formação e que termina este primeiro volume dizendo que – com apenas 10 anos – se sente sem pontos de referência.
formação e que termina este primeiro volume dizendo que – com apenas 10 anos – se sente sem pontos de referência.
E, por tudo isto, urge
conhecer esta narrativa inteligente, viva, emotiva, feita com um traço rico de
contrastes claro/escuro e de uma simplicidade desarmante – quase de uma menina
de 10 anos...”
Hoje, lida esta soberba obra
em português, se não altero o que então escrevi, preciso de acrescentar mais.
Porque “Persépolis” – sem
dúvida um longo exercício de catarse pessoal, através do qual Marjane Satrapi
finalmente se encontrou e encontrou a forma de se expressar – continua bem para
além dos 10 anos da autora.
Porque atravessa toda a sua
adolescência – difícil e conturbada – passada até aos 14 anos no Irão, arrasado
e virado do avesso pela revolução islâmica, com todas as consequências que ela
teve sobre o nível de vida, sobre as liberdades individuais e sociais, pelas
mudanças forçadas – uso de véu, proibição de imagens, religiosidade imposta,
perseguições políticas…
Porque narra, também, a sua
estadia na Áustria – uma estrangeira “exótica” entre estranhos – e as suas
dificuldades de adaptação – à língua, aos costumes, aos hábitos, às diferentes
liberdades, aos outros, às suas próprias mudanças, no corpo e na mente – a
procura nos amigos, nos namorados, no tabaco, na droga de si própria e do
caminho para a sua vida.
Porque, ainda, conta o seu
regresso ao Irão – destroçada e sem rumo definido – um regresso a um passado
que queria esquecer mas que continuava presente, mas também um regresso à sua
família, a sua mais sólida referência a muitos níveis, o que lhe veio a
possibilitar (um)a (sobre)vivência e o encontrar no desenho, na arte – na BD,
mais tarde, já em França – da sua forma de estar na vida e de se expressar.
E ainda, finalmente, porque a
par das experiências, a muitos níveis marcantes e traumáticas, que Satrapi
enfrentou, “Persépolis” - desenhado a preto e branco num estilo naif mas
surpreendentemente funcional para uma primeira obra de uma autora que
praticamente desconhecia a BD - para além da sua experiência pessoal, marcada
por todas as mudanças – físicas, mentais… - inerentes à passagem da
adolescência à idade adulta, traça também um panorama, não isento mas verídico,
da realidade iraniana durante o período que a obra aborda.
A reter
- Mais uma edição –
importante e imprescindível – de uma banda desenhada de referência em
português, neste tempo de crise. A não perder.
- A boa edição da
Contraponto, compacta, com boa impressão e tradução.
- A obra em si, claro está, de
leitura fácil, como um autêntico romance, tendo a seu favor a autenticidade que
o carácter autobiográfico lhe confere.
- E pelo valor intrínseco do
que narra, mas também pela forma forte como Satrapi o narra.
Menos conseguido
- Tantos anos de espera pela
edição integral de “Persépolis” em português…
Curiosidades
- Originalmente “Persépolis”
foi lançado em 4 volumes, em França, pela L’Association, entre 2001 e 2003. O
primeiro deles teve edição portuguesa da Polvo, em 2003.
- Marjane Satrapi esteve
presente, com uma exposição de originais, no XI Salão Internacional de Banda
Desenhada do Porto, em 2001.
- Entre vários outros
prémios, “Persépolis” foi distinguido no Festival de BD de Angoulême, em
França, com os troféus para autor revelação e melhor argumento e, mais tarde,
nos EUA, com o Eisner para melhor romance gráfico e melhor obra estrangeira.
- Esta obra deu origem a uma longa-metragem de animação, em
2007, co-escrita
e co-dirigida pela própria Marjane Satrapi e por Vincent Paronnaud, que
estreou no Festival de Cannes e foi premiado com um Óscar.
Uma obra de leitura fundamental para amantes da nona arte. Aqui no Brasil foi lançada em 2007 a edição completa pela Cia das Letras através do selo Quadrinhos na Cia. http://www.guiadosquadrinhos.com/edicao.aspx?cod_tit=pe153101&esp=&cod_edc=58254
ResponderEliminarCuriosamente nada chegou as livrarias ainda,mas em algumas tem a venda o 1 volume da Polvo
ResponderEliminarOlá Optimus,
EliminarA informação que eu recebi da editora indicava a data de hoje para o início da distribuição do livro, mas eu também ainda não o vi à venda.
Quanto ao aparecimento da edição da Polvo, não é nada de novo, sempre que é anunciada uma nova edição/colecção de BD.
Não sei de quem é a culpa, mas nesses casos, recorrentemente, surgem de novo as edições antigas...
Boas leituras!