Comemorado
pela primeira vez na passada sexta-feira, dia 18 de Outubro, o Dia
Nacional da Banda Desenhada Portuguesa é uma realidade que resultou do trabalho
e persistência de várias pessoas, e foi assinalado aqui no blog com
uma lista de obras de autores nacionais a ler.
Para
assinalar a data, o Jornal de Notícias pediu um depoimento a
diversos autores, editores e organizadores de festivais, para um
texto publicado online no dia 18. O que podem ler a seguir, por ordem
alfabética, são as versões integrais dessas opiniões.
As Leituras do Pedro - Resume o processo que levou à criação do dia Nacional da BD Portuguesa
Paulo Monteiro - Há alguns anos que se falava na possibilidade de escolher um dia para celebrar a BD entre nós.
A Bedeteca de Beja promoveu um debate sobre o assunto no XVII Festival Internacional de Banda Desenhada de Beja, subordinado ao tema “Dia Nacional da Banda Desenhada” (dia 28 de maio de 2022), onde participaram Cristina Gouveia, Dário Duarte e Pedro Moura, e no qual se discutiram várias propostas (eu próprio participei com algumas opiniões, “integrado” no público).
Depois a coisa arrefeceu (como costuma acontecer), até que Hugo Pinto, autor do blog Vinheta 2020 ressuscitou a questão promovendo uma petição pública sobre o assunto. Na petição propunha-se o dia 18 de outubro - dia em que a Banda Desenhada integrou a Academia Nacional de Belas Artes - como “Dia da Banda Desenhada Portuguesa”.
Como a petição não recolheu as assinaturas suficientes, surgiu a hipótese, junto de Saafa Dib, militante do partido Livre e editora de A Seita, de levar esta questão à Assembleia da República, como proposta do Livre. A escolha foi apresentada à Comissão de Cultura do Parlamento pelo deputado Jorge Pinto e mais tarde votada por unanimidade.
Bem sei que boa parte dos leitores e das pessoas que se dedicam à banda desenhada a nível profissional (autores, editores, críticos, divulgadores, livreiros, programadores culturais, etc.), passaram ao lado da escolha desta data (tal como eu). Alguns poderão subscrevê-la, outros não.
Seriam muitas, as datas possíveis: o dia em que António Nogueira da Silva publicou a primeira bd portuguesa, “As Aventuras Sentimentaes e Dramáticas do Senhor Simplício Baptista” (a data que eu preferiria - 3 de agosto de 1850), o nascimento de Bordalo Pinheiro, a primeira publicação do Quim e Manecas, a data de fundação d’O Mosquito, etc., etc.
Não é fácil chegar a um consenso (o que só demonstra a enorme riqueza da nossa BD).
Mas a verdade é que todas as datas podem caber dentro de dia 18. O que interessa é que estejamos juntos em defesa desta arte maior que tanto amamos. O dia aí está! Compete-nos agora celebrá-lo com a dignidade que merece!
Penim Loureiro - Comentário à questão: É extremamente difícil resumir um processo que decorre há mais de 5 anos, que já sofreu muitos retrocessos no passado e que se confunde com a luta pela credibilidade e pela visibilidade da BD portuguesa em Portugal.
A ideia, partilhada por vários autores de BD, de criar um dia nacional da Banda Desenhada vinha já de longe, mas foi em 2021, após partilhar este intento com o Paulo Monteiro e o Dário Duarte que se tornou um propósito firme, claramente dedicado à BD portuguesa com a designação definitiva de Dia da Banda Desenhada Portuguesa.
O principal obstáculo provinha, porém, da própria comunidade de BD; a data não era consensual. Alguns grupos sugeriam datas das primeiras edições da BD nacional, outros, datas referentes a autores clássicos, mas não surgia nenhuma proposta verdadeiramente imparcial.
Nessa altura eu continuava a minha tarefa de divulgar a banda desenhada e implantar o ser reconhecimento em diferentes meios, normalmente alheios à 9ª arte. Tal como já, anteriormente, tinha levado a BD ao Museu Rafael Bordalo Pinheiro e à distinta fábrica Vista Alegre, levei à Academia Nacional das Belas Artes a proposta da Banda Desenhada integrar as áreas contempladas para investigação e divulgação nesta prestigiada academia.
A Banda Desenhada portuguesa (a par do Cinema e da Dança) ficou oficialmente representada na Academia Nacional de Belas-Artes, pelo valor artístico e cultural que acrescentam ao nosso país, no dia 18 de Outubro de 2023. Um reconhecimento justo e merecido dado à Banda Desenhada que a ajuda a conferir estatuto como Arte maior e emancipada junto dos meios académicos.
Foi nesta ocasião que um grupo de autores (Daniela Viçoso, Inês Garcia, Joana Afonso, João Amaral, José Bandeira, Paulo Monteiro, Penim Loureiro, Marco Fraga, Mosi, Ricardo Baptista, Tiago Cruz e Thais Linhares) concordaram que a data da inclusão da BD na Academia era um momento suficientemente importante e simultaneamente imparcial para ser proposta à Assembleia da República como dia nacional. Pela mão do Hugo Pinto foi criado um abaixo-assinado que conseguiu reunir várias centenas de apoiantes através do seu blogue ”Vinheta 2020”. Mas foi através da Safaa Dib e do Rui Tavares, deputado do LIVRE, que este desejo ficou concretizado no passado mês.
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As Leituras do Pedro - Para que serve/deve servir este dia?
Catarina Valente (directora do Amadora BD) - Antes de mais, cumpre congratular a iniciativa e a vontade coletiva de celebrar a banda desenhada condignamente. Este dia é de enorme importância não só para a legitimação da banda desenhada, mas também para a sua divulgação, sobretudo, da BD produzida pelos autores portugueses. Acredito que será uma oportunidade de estimular o desenvolvimento de programação cultural e artística com enfoque na banda desenhada, bem como a edição de mais BD portuguesa, que, recentemente, tem demonstrado uma enorme vitalidade, fruto do empenho e dedicação dos editores portugueses. Que esta data renove a esperança no crescimento da comunidade de leitores de BD e que os eventos de BD de todo o país continuem a apoiar e a apostar na BD portuguesa. O Amadora BD assim o continuará a fazer.
Derradé - Este dia, pelo qual lutei e tentei promovê-lo junto da comunidade bedéfila, servirá no meu entender, como um agregador de atenção. Neste dia seria bom que as lojas (livrarias independentes, grandes grupos e grandes superfícies) fizessem montras, e promoções, que as bibliotecas e escolas convidassem autores e editores da área para actividades (conversas ,workshops, o que fosse...), que uma pequena peça pudesse passar nas TVs, rádios e jornais (nos media portanto...) para dar destaque à BD feita por portugueses. E que de uma vez por todas se esclareçam as pessoas de que a BD NÃO É UM GÉNERO, mas sim uma linguagem, um meio de comunicação, onde cabem todos os géneros e onde cabe tudo desde o excelente até ao mais rasca, tal como a literatura, a música, o cinema, o bailado, etc...
Jorge Deodato (Escorpião Azul) - Serve para divulgar a produção nacional e não só, a um público mais vasto. A criação deste dia vai transportar a banda desenhada para um patamar superior, o respeito merecido por todos. Sem dúvida que terá uma maior visibilidade.
José de Freitas (A Seita) - Um dos objectivos principais da criação de uma data deste tipo é o de servir para chamar a atenção sobre a BD nacional, e em particular para a existência de um número bem grande - e crescente - de criadores que trabalham nesta área, e sobre os livros que todos os anos saem de autores nacionais, num mercado cada vez mais concorrencial, e em que competem directamente com o que de melhor se faz no mundo em termos de BD. Acessoriamente, deveria também servir para educar o público leitor sobre o que é a Nona Arte, porque é que ela é distinta das outras formas de criação literária, e para ensinar que ela não é só para crianças, mas para todo o público.
Era bom que a esta data fosse associado algum tipo de programa mais institucional de apoio à BD portuguesa, e de sensibilização para a sua leitura, mas isso são esforços a empreender para o futuro.
Luís Louro - Para início de conversa, este dia servirá para lembrar a muita gente que existe banda desenhada em portugal, e boa bd que vale a pena celebrar. Mas para mim o dia da bd é quando um homem quiser…!
Paulo J. Mendes - Poderá servir para, através de iniciativas destinadas ao público em geral, lembrar/celebrar/mostrar a BD Nacional a quem (ainda) não a conhece, assim como o trabalho desenvolvido por todos os seus intervenientes ao longo dos restantes 364 dias do ano.
Paulo Monteiro - Para celebrar a BD portuguesa e para chamar a atenção para a sua diversidade e riqueza. Funciona também como uma chamada de atenção para o rico património artístico que o país detém, neste particular.
Penim Loureiro - Comentário à questão: O seu propósito é o das restantes efemérides: com elas renovam-se as esperanças de que as coisas melhorem em todos os sentidos.
Independentemente de se poder achar mais importante ou menos importante esta distinção, não deixa de ser mais um degrau no sentido de valorizar o trabalho de todos os autores, editores e divulgadores de banda desenhada, bem como contribuiu para dar visibilidade à BD junto de públicos muito distintos, uma vez que o crescimento da BD entre nós tem que se fazer em todas as direções. Em termos práticos este reconhecimento permitir-nos-á criar oportunidades de integrar uma série de dinâmicas que anteriormente raramente a incluíam.
É inegável que a banda desenhada portuguesa tem dado provas recentes de grande crescimento, maturidade e profissionalização. Com a criação do dia da Banda Desenhada Portuguesa, possibilita-se também a valorização das potencialidades pedagógicas da BD para o ensino do (de todas as formas de narrativa), retirando-a das margens e dando-a a conhecer a todas as pessoas.
Rui Brito (Polvo) - Essencialmente para trazer para a ordem do dia mediática o/a autor/a portuguesa e, num plano mais secundário, todos os intervenientes no meio (editores, etc.).
Numa outra esfera, poderá/deverá fazer recair sobre a BD portuguesa uma atenção "programada", com a realização por parte de determinadas instituições (por exemplo as Bibliotecas Públicas Municipais) de actividades em torno dela, como sejam exposições, workshops, encontros com autores, apresentações/lançamentos...
Sílvia Reig (Levoir) - Dá relevância à denominada 9ª arte. Ainda hoje, no século XXI, existe bastante preconceito para com a banda desenhada.
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As Leituras do Pedro - O actual momento editorial justifica a sua criação?
Dearradé - Estamos a viver uma nova idade do ouro da BD Portuguesa, quer em termos criativos, quer em termos de número de edições. Infelizmente em termos de tiragens as coisas são como são... o livro tornou-se um luxo (muitas vezes por escolha e não por falta de poder de compra) e a BD dentro desse nicho é ela própria um nicho. Mas a existência do dia não se justifica somente pelo momento actual, mas também por sermos um dos países pioneiros na Nona Arte.
Jorge Deodato (Escorpião Azul) - A banda desenhada portuguesa vive o seu melhor momento de sempre, existem editoras e autores de todos os tipos que têm uma oferta diversificada para todo o género de leitores, sem dúvida que foi o momento ideal para a sua criação.
José de Freitas (A Seita) - Penso que sim. Embora se note uma certa retracção na venda de livros em geral por efeito de alguma crise (e do aumento do preço dos livros em particular), a verdade é que nestes últimos anos - esta última década, digamos - o número de obras de BD nacionais tem vindo aos poucos a crescer, em número de lançamentos, em qualidade, e em número de criadores. E sentimos muitas vezes que há da parte dos leitores uma sensação de que as obras de BD nacionais já não são "menores" em relação às obras traduzidas.
Luís Louro - O actual momento editorial parece-me muito saudável… o que é mais uma boa notícia e que da mais significado a esta iniciativa.
Paulo J. Mendes - A BD nacional já tem “pergaminhos” que vão mais além do actual momento editorial, mas este muito terá a ganhar se com a criação deste dia e respectivas iniciativas resultarem novos leitores.
Rui Brito (Polvo) - O actual momento editorial não devia ter importância para o caso, pois este dia já podia ter sido criado há anos. O importante é assinalar a sua criação.
Sílvia Reig (Levoir) - Penso que este dia poderia ter existido há mais tempo, não se deve ao actual momento editorial mas sim à persistência de um grupo de pessoas que apoiaram a iniciativa e insistiram.
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