A
unanimidade que 'Blacksad' justifica
Sei
que a unanimidade é perigosa mas no caso de Blacksad
é impossível não ficar deslumbrado pelo originalidade da sua
estrutura, pela qualidade das histórias e pela desenvoltura do traço
desta criação dos espanhóis Juan Díaz Canales e Juanjo Guarnido
O
título mais recente Então,
tudo cai
é, até agora, o mais ambicioso da série e talvez por isso foi
necessário dividir a história por dois álbuns - e
sobre o primeiro, já escrevi aqui - que
a Ala dos Livros já disponibilizou em português, reproduzindo as
capas originais que compõem uma imagem única (ver acima), com quatro dos
principais intervenientes e a coragem da segunda não ter o
protagonista.
Ambientada numa Nova Iorque efabulada, a história passas-se há décadas atrás, mas soa estranhamente actual, pois combina ambições pessoais, interesses imobiliários e ligações perigosas entre políticos e gente pouco recomendável, numa trama repleta de segredos incómodos, em que os passados de algumas personagens as atrapalham e os cadáveres se vão multiplicando.
A par deste contexto mais genérico, em que artee progresso parecem servir propósitos antagónicos, o protagonista, que dá título à série, reencontra antigas ligações, como sempre escolhe o lado errado das trincheiras e acabará por pagar caro as suas opções, fazendo, também ele jus ao título que aponta para a finitude da impunidade das injustiças e dos negócios esconsos, sem que isso implique nenhum fundo nem lições de moral.
Policial negro, contido nos diálogos, deixando que arte - e que arte! e que cores! e que jogo de sombras! - de Guarnido tenha a primazia na narração da história - revela no entanto como Canales é extremamente assertivo e certeiro nas palavras que coloca na boca das tuas personagens com uma qualidade de escrita peculiar e uma enorme capacidade de transmitir muito com pouco.
E se, adequadamente, numa história que também tem ligações com a representação e o teatro, o tom de tragédia vai aumentando página a página, nenhum leitor estará preparado para a cena final, monumental e ao mesmo tempo representativa da pequenez do ser humano ou, em Blacksad, dos animais antropomórficos que nos espelham e representam de forma tão forte, marcante e reveladora....porque na verdade é, “então, (que) tudo cai”.
Blacksad:
Então, tudo cai
Juan
Díaz
Canales (argumento)
Juanjo
Guarnido (desenho)
Ala
dos Livros
Portugal,
2023
235
x 310 mm, 56
p., cor,
capa dura
17,50
€
(versão revista do texto publicado na página online do Jornal de Notícias de 16 de Fevereiro de 2024 e na versão em papel do dia seguinte; imagens disponibilizadas pela Ala do Livros; clicar nesta ligação para ver mais pranchas ou nas aqui reproduzidas para as aproveitar em toda a sua extensão; clicar nos textos a cor diferente para saber mais sobre os temas destacados)
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