Está
finalmente
disponível
em português,
numa belíssima edição de A Seita, o segundo e último volume de A
Fera
que, na edição lusa, traz como extras uma história curta e um
passeio guiado e ilustrado pela Bruxelas de Frank Pé, que desvenda
alguns dos segredos e referências que espalhou pela história - e
que permitem, justificam até, uma segunda leitura atenta aos
pormenores e não ao fundamental.
Na actualidade, no regresso a casa após uma vitória em tribunal que
o inocenta da morte de uma criança devido a uma mina anti-pessoal,
um magnata da indústria do armamento vê o filho vitimado por um
desses engenhos, ditos "inteligentes", no próprio jardim.
Barcelona,
últimos estertores do século XIX. Vidal, Balaguer i Carbonell,
considerado pelos seus pares um dos prodígios do modernismo catalão,
está cada vez mais introvertido e irascível. Suspenso
o mecenato do pai, que sempre o apoiou, recusa separar-se dos seus
quadros, perdendo vendas avultadas e a possibilidade de pagar as
muitas dívidas e endireitar a sua vida. O
início desta espiral descendente coincidiu com a desaparecimento de
Mar Noguera Monzó, sua musa e amante, após a pintura de um belo
retrato dela.
Geralmente,
associamos o conceito de série a histórias com protagonista fixo.
No caso de A
Adopção,
cujo segundo volume
português (correspondente ao segundo ciclo),
Wajdia
& Arrependimentos
acaba de ser editado em português pela Ala dos Livros, os
protagonistas mudam de ciclo para ciclo, mantendo-se apenas a
temática de base: a adopção de crianças.
Esta
história tem por cenário o Beco do Bebé com Bigode. A artéria não
se chama assim, claro, mas quase todos esqueceram o barão que lhe
deu nome, quando um vândalo de trazer por casa decidiu pintar um
farfalhudo bigode no bebé da publicidade a um sabonete, que decora o
muro no fundo da rua.
Se
no cinema é normal seguir actores, na banda desenhada geralmente
procuram-se determinados desenhadores. Mas, tal como na Sétima Arte
há quem escolha os filmes preferencialmente pelos seus realizadores,
também na BD há leitores que fazem as suas escolhas com base no
nome do argumentista. Neste
particular, Zidrou é um dos nomes a reter e, se as suas obras de tom
humano estão hoje espalhadas por diversos catálogos nacionais, em
boa hora as editoras A Seita e Arte de Autor se uniram para lhe
dedicarem uma colecção de que Emma
G. Wildford
é o tomo mais recente.
Esta homenagem a Os Túnicas Azuisé uma das primeiras grandes surpresas - e leituras - deste ano, desde logo pelo lote de autores que reúne: entre outros, José-Luis Munuera, Aimée de Jongh, Denis Lapière, Olivier Schwartz, Eric Maltaite, Zidrou e… Blutch (!), que também assina a capa.
Com
o nome de Zidrou como chamativo era impossível passar ao lado deste
Hollywoodland,
uma obra em dois tomos que pretende assinalar o centenário - em
Julho deste ano - do
célebre letreiro (curiosamente
criado para publicitar um projecto imobiliário que não se
concretizou) que
todos já
vimos vezes sem conta em filmes - e alguns ao vivo…? É
um conjunto de pequenas crónicas irónicas e mordazes sobre os
sonhos anseios e falhanços daqueles que se aproximavam da Meca do
cinema, esperando tornar-se astros brilhantes por
lá.
“Todos
sonhamos com histórias que acabam bem”, lê-se a certa altura em A
Adopção,
mas, raramente, sabemos o que é ‘acabar’ e o que é ‘bem’. E
temos tendência para procurar a felicidade nos outros, no acessório,
no que está longe, como se aquilo que nos rodeia, que está mesmo à
nossa beira não pudesse suprir - e de forma bem mais consistente -
“esta esperança, esta cegueira” - a
tal ‘felicidade’ - que
é “a força da humanidade”.
E
se o Marsupilami, em vez de ser o animal amigável e divertido que
todos nós conhecemos graças ao génio de André Franquin, fosse na
verdade - de forma compreensível e natural - uma fera selvagem
(quase) incontrolável? Este
enredo, imaginado por Frank Pé e depois maravilhosamente escrito por
Zidrou para o desenho sublime daquele,
proporciona-nos outra das grandes leituras do ano e uma soberba
homenagem a (uma das maiores criações de) um génio da BD.
Se
o conceito de ‘comida de conforto’ é hoje em dia recorrente e tem muitos adeptos,
nunca ouvi falar de ‘Banda
desenhada
de conforto’. Mas ela existe e Verões
Felizes,
de que a Arte de Autor acaba de editar o terceiro díptico, é um bom
exemplo deste
conceito (inexistente).