Volto a Le Storie
e sou obrigado a reafirmar o que escrevi
há menos de um mês:
'diversidade' é o mote desta (magnífica) colecção da Bonelli.
Chanbara, como o sub-título
deixa intuir,
decorre no Japão feudal tradicional e compila duas histórias de
vingança.
Aventura pura, com as emoções como
pano de fundo, esta é mais uma inflexão - ou apenas mais uma
proposta, curiosamente uma
das suas primeiras propostas
- numa colecção de relatos independentes, sem qualquer outro
critério que não a qualidade.
De comum às duas narrativas de
Roberto Recchioni - sim, o mesmo do excelente Dylan
Dog: Mater Morbi - há
apenas Ichi, um velho cego, mais sábio do que aparenta, mais forte e
ágil do que o aspecto físico decadente e a idade deixam antecipar,
que cria a ponte entre ambas e deixa a vontade de conhecer melhor o
seu passado e a sua história.
Melhor, a vontade de conhecer melhor este universo que agradará com
certeza a
quem se sente atraído pela cultura nipónica mas também a quem
gosta de uma boa banda desenhada de acção.
Em ambos os relatos - e não se
deixem enganar pela presença
de Ichi e pela aparente
continuidade entre eles, apenas acontecem num mesmo universo
narrativo, com a curiosidade
de um suicídio sacrificial
ser o remate de um e a origem
de outro - a vingança é o
mote, embora as razões que a fazem desejada variem.
La redención del samurái,
começa com a perseguição a um samurai
que (aparentemente) não cumpriu a sua missão, mas o seu sacrifício
permitirá desvendar males maiores. Quanto a Las flores de
la Masacre, desta vez com
protagonismo feminino, segue o percurso de uma jovem esposa que passa
de vítima de violência doméstica -
como diríamos hoje... - a
vingadora cruel - e mais
ainda.
A primeira é uma história de
crescimento pessoal, em nome do bem comum; quanto à segunda, em
que impera a individualidade,
é uma história de crescimento e superação pessoal, embira
possivelmente não pelas melhores razões.
Ichi, surge em ambas pontualmente,
como conselheiro e
consciência, tentando que a violência,
necessária,
não extravase os limites do razoável - e, sim, eu sei o quão
estranho e perigoso isto soa. Mas, numa época e num meio específico
- de senhores feudais (quase) todo-poderosos e de servos, simples
criados ou guerreiros qualificados,
mas ainda assim meros servos
- imperavam
o sentido de honra, a coragem e a necessidade de cumprir o dever
acima de tudo. Mesmo quando se discordava do senhor, mesmo quando as
tarefas eram claramente iníquas.
É
esta dualidade entre o que devia ser e o que era necessário fazer
que tornaram tão apetecíveis ao moralmente díspar ocidente tantas
obras de samurais
e o levaram a espelhar essa forma de estar no cinema, na televisão e
na banda desenhada.
As
duas narrativas aqui reunidas, são mais um exemplo disso. Para além
dessa dupla sensação de estranheza/curiosidade, atraem também pela
sua legibilidade extrema - o relato avança por si só, com os
diálogos reduzidos ao mínimo, com a vertente gráfica a imperar na
condução do leitor - e as sucessivas cenas de acção, dinâmicas,
intensas, surpreendentes - veja-se em especial o confronto final da
segunda história.
O
caderno final que fecha mais uma boa edição da Panini espanhola,
reproduz um bom lote de esboços de Andrea Accardi - cujo traço é
servido por uma ampla paleta de cores, de acordo com os momentos
descritos - que permitem descobrir algumas das suas fontes de
inspiração e que o seu traço ágil, apesar da sua matriz clássica
e a boa reprodução do corpo e do movimento humanos não surge do
nada, é atingido com trabalho, treino, tentativa e erro...
Inclui Le
Storie #2 a
redenzione del samurai (2012)
e #15 i fiori del
massacro (2013)
Roberto Recchioni (argumento)
Andrea Accardi (desenho)
Stefano Simeone e Luca Bertelè (cores)
Panini
Espanha, 28 de Fevereiro de 2019
195 x 259
mm (deluxe), 256 p., cor, capa dura
22,00 € (cada)
(pranchas
da
edição original italiana;
clicar nas
imagens
para as aproveitar em toda a sua extensão)
Só conhecendo da Bonelli o que foi ultimamente publicado por aqui (basicamente, coleção Bonelli e Tex), gostava mais destes "La Storie" na referida coleção Aleph do que o Dylan Dog.
ResponderEliminarE porque não Le Storie E Dylan Dog? ;)
EliminarO Velho que lê, tem duas histórias magníficas...
Boas leituras!
Obviamente numa mera opinião pessoal, Dylan Dog não me atraiu grande coisa.
EliminarAcredito naturalmente que os editores pensem que uma personagem mítica seja mais atractiva para uma nova coleção. Quanto mais não seja, como motivo do seu lançamento.
E se isso se confirmar e a coleção encontrar "pernas para andar", à partida ficamos todos a ganhar.
É uma pena que a linha "Le Storie" vá provavelmente ser cancelada (se é que não foi já?).
ResponderEliminarPara já Le Storie ainda continua a ser publicada... em Abril sairá o número 79:
ResponderEliminarhttps://www.sergiobonelli.it/le-storie/2019/02/27/albo/china-song-1-sulla-via-della-seta-1004303/
Então, longa vida a Le Storie!
EliminarBoas leituras!