Devido
à pequena dimensão do mercado editorial português de BD e às
consequentes tiragens curtas, há obras nacionais que se tornaram
quase lendárias. Uma
delas é A
Fórmula da Felicidade,
publicada originalmente em dois tomos há cerca de década e meia
(2008
e 2009) que
desapareceram há muito do mercado e eram procuradas por
colecionadores ou leitores interessados. Agora,
ressurge numa edição integral, com todas as vantagens das técnicas
de produção e impressão modernas, e com um posfácio extra de 16
páginas, que na verdade é um prólogo e acrescenta um elemento
importante ao relato.
Já
evocada pela banda desenhada em obras como Rugas,
de Paco Roca (edição Levoir), a doença de Alzheimer é um dos
piores pesadelos que podemos antever. Pelo esquecimento progressivo,
mas também pelos momentos de lucidez que vão ocorrendo. É por isso
que uma das protagonistas de Não
me esqueças,
que a ASA acaba de editar, diz:
“Acho
que estou a ficar maluca… Mas o pior é quando me lembro”.
Considerado
hoje por muitos “o grande romance americano”, O
Grande Gatsby,
quase a completar 100 anos da primeira publicação, em 1925, não
teve na altura grande sucesso,
tendo vindo no entanto a ganhar relevância ao longo dos anos. Na
actual apetência da banda desenhada pela adaptação de clássicos
da literatura, naturalmente
esta obra de F. Scott Fitzgerald não passou despercebida e uma das
versões mais recentes tem a assinatura do desenhador português
Jorge Coelho.
Há
autores que na nossa mente ficam indelevelmente associados a uma obra
ou uma série. Para mim, no caso de Dany, ele é o criador gráfico
do maravilhoso universo de Rêverose, onde vivem Oliver Rameau,Colombe Tiradaille e todos os seus espantosos amigos. Por
isso, nunca lhe perdoei o que fez a Bernard Prince e nunca consegui
fechar nenhuma das suas propostas realistas sem ter (re)visto a bela
Colombe em cada uma das suas personagens femininas.
E
se afinal, as sublimes pinturas que desde sempre atribuímos ao génio
de Van Gogh, afinal não tivessem sido pintadas por ele, mas sim…
pelo seu gato?! É esta a base de Vincent
e Van Gogh,
que a Arte de Autor acaba de editar em versão integral.
Último
álbum deixado concluído por José Ruy e segunda edição póstuma
em 2023, com a chancela da Polvo, O Mistério dos Templários é
um belo espelho da coerência que sempre foi apanágio da vida e a obra do autor.
A
Espera,
oportuna edição recente da Iguana, é um relato biográfico em que
a autora, a coreana Keum Suk Gendry-Kim, nos conta a vida da mãe
antes, durante e depois da separação das duas Coreias, após a II
Guerra Mundial e a divisão do mundo em dois blocos. Obviamente,
porque parte da narrativa decorre no tempo presente, há em A
Espera
também uma componente autobiográfica, numa exposição contida, e
de alguma forma catártica, da autora, que se utiliza para realçar o
momento actual da mãe e a sua relação nem sempre fácil com ela,
como reflexo de tudo o que sofreu no momento da divisão da península
coreana.
Há
dias, a propósito de uma história de Dylan Dog, evoquei bandas
desenhadas que decorrem e/ou se alimentam do meio em que são
narradas e, por um daqueles acasos curiosos, uma outra, precisamente
esta
B.D.
Meurtres,
veio parar-me
às mãos.
Lido
este volumoso tomo, a cena inicial revela-se quase premonitória. A
torrente, criada pela chuva intensa que, em lugar de lavar e
purificar, arrasta toda a porcaria que encontra pelo caminho - e até
os caixões desenterrados do cemitério local - para as ruas de
Barro-City, irá obrigar a uma limpeza geral.
Foram
muitos aqueles que em Portugal, desde os anos 1970, cresceram a ler
as revistas da Turma da Mônica, que actualmente, como então, ainda
podem ser encontrados em (alguns)
quiosques
e
bancas nacionais. Ao
longo dos anos, mais do que uma vez, foi levantada a hipótese de
produção portuguesa de alguns desses títulos, com a linguagem mais
adequada ao nosso português, mas no final, curiosamente, a estreia
lusa da Mônica, Cebolinha, Cascão e Magali acaba por acontecer com
uma das propostas alternativas da linha Graphic MSP, uma chancela
criada no Brasil em 2012, para que autores fora daquele universo,
dessem a sua visão pessoal das personagens de Maurício de Sousa.
Mal
amado por muitos, o
álbum As
Joias
da Castafiore
é possivelmente o mais original e desafiador da série. Com
ele, nele,
Hergé
assumiu
sempre querer contar uma história em que nada acontece ou, mais
exactamente, em que nada
do que parece é realmente.
Por
vezes, há termos ou frases que se revelam extremamente felizes para
definir uma obra. Maurício de Sousa foi-o no prefácio em relação a este
Cebolinha:
Recuperação,
definindo-o como “uma trama com muitas camadas (…),
exactamente como uma cebola”.
Se
é verdade que o manga é um dos géneros de que mais livros são
editados mensalmente em Portugal, no que à banda desenhada diz
respeito, também é indiscutível que eles representam apenas um
pico mínimo do gigantesco icebergue do que é a produção japonesa. Entre
os estereótipos que associamos ao género, as narrativas de ninjas e
samurais têm sido muito pouco exploradas no nosso país, sendo
Kenshin,
o
samurai errante
o
exemplo mais significativo. O
preço da desonra,
uma edição da chancela Ikigai,
do
coletivo editorial A Seita é uma (boa)
exceção recente. E é, simultaneamente, uma forma de dar a conhecer
aos leitores portugueses um dos expoentes do género, o autor Hiroshi
Hirata (1937-2021).
O
assinalável crescimento do mercado nacional de banda desenhada, para
além do fortalecimento dos segmentos dominantes de franco-belga e
manga, trouxe também a aposta de editoras que geralmente não se
dedicavam a este género narrativo e uma maior diversidade da oferta.
Começou
hoje a ser distribuída com o jornal Público
a nova colecção da ASA, O
Assassino,
uma criação de Matz (que já conhecemos bem de Tango)
e Jacamon, nascida nas páginas da (A
Suivre)
em 1998 e originalmente publicada até 2014, num total de 13 álbuns.
Para
aqueles que têm lamentado o mimetismo imposto aos sucessores de
Edgar P. Jacobs, este livro assinado por Jean-Luc Fromental,
José-Louis Bouquet e Floc'h poderá representar uma lufada de ar
fresco mas,
cuidado
com o que desejam…